quarta-feira, 30 de janeiro de 2013
domingo, 27 de janeiro de 2013
Lampião assustou Cristiano Cartaxo
por Francisco Frassales Cartaxo
Cresci ouvindo meu pai narrar, vez por outra, o susto que passou ao
ver-se frente a frente com Lampião. Cristiano Cartaxo (foto) contava sempre a mesma
versão, quase com as mesmas palavras a indicar a veracidade do episódio por ele
vivido. Certa ocasião, noite alta, ele se dirigiu à Farmácia Central, fundada
pelo seu pai, o major Higino Rolim, para aviar uma receita, a pedido de pessoa
amiga. Nessa época, década de 20 do século passado, a farmácia ficava na Rua
Sete de Setembro, hoje Avenida Presidente João Pessoa. Cristiano entrou na
botica, deixando a porta entreaberta, e foi preparar o remédio. Com pouco
tempo, apareceu um desconhecido em trajes estranhos, arma de fogo e punhal. Meu
pai apressou-se em procurar atendê-lo àquela hora da noite:
- O senhor deseja alguma coisa? Precisa de algum remédio?
Disse mas não obteve resposta. O estranho esboçou apenas um leve sorriso,
deu alguns passos, lentamente, parou para espiar melhor as pra- teleiras, voltou
a caminhar pelo pequeno corredor até os fundos da loja, sem uma palavra, por
mais que meu pai insistisse em oferecer-lhe seus serviços profissionais de farmacêutico.
O visitante saiu pela porta, não sem antes fazer breve reverência de cabeça.
Meu pai, sem pestanejar fechou a porta com ferrolho e voltou à sua tarefa.
Claro que teve medo, sobretudo, porque isso se deu após o ataque do cangaceiro
Sabino Gomes (foto) que, segundo meu pai, tinha como um dos seus objetivos ao invadir
Cajazeiras “agarrar o enxu do major Higino”, numa referência ao cofre da farmácia
do meu avô.
Sabino Gomes conhecia bem Cajazeiras. Fora guarda-costas de Marcolino
Diniz, um cidadão que residiu em Cajazeiras, pouco depois de assassinar o
bacharel Ulisses Wanderley, juiz de direito da cidade de Triunfo (PE), em 30 de
dezembro de 1923. Preso em flagrante, foi solto pelos cabras de Sabino, a mando
de Lampião, que era amigo e protegido do coronel Marçal Florentino Diniz, pai
de Marcolino. Em Cajazeiras, Marcolino fundou e manteve, junto com o advogado
Praxedes Pitanga, o jornal O Rebate, que circulou entre 1925 e 1928. Marcolino era
irmão unilateral de Sabino Gomes, pois este nascera de relação sexual do
coronel Marçal com sua cozinheira, em Abóboras, município de Serra Talhada (PE),
perto de Princesa Isabel, terra do famoso coronel José Pereira, aliás, sogro de
Marcolino Diniz. Sabino chegou a trabalhar nas obras de construção do açude de
Boqueirão e desfilava armado pelas ruas de Cajazeiras, na qualidade de capanga
de Marcolino Diniz.
Foto batida pelo fotógrafo profissional, Francisco Ribeiro em Limoeiro do Norte |
Como o poeta Cristiano soube que o cangaceiro misterioso era Lampião? Meu
pai o identificou numa foto que correu mundo, batida pelo fotógrafo
profissional, Francisco Ribeiro, em Limoeiro do Norte, quando o bando ali
estacionou, ao re- gressar da frustrada invasão a Mossoró. Em Limoeiro, os
cangaceiros foram recebidos sem hostilidade. Ao contrário, tiveram direito a
banquete, fizeram compras no comércio e até rezaram na igreja em companhia do
padre.
Revejo, agora, a foto histórica, in- serida no livro de Frederico
Per- nambucano de Mello: Guerreiros do sol - Violência e banditismo no Nordeste
do Brasil -, talvez o melhor estudo acerca do fenômeno social do cangaço nordestino.
Revejo com saudade do meu pai que, em 2013, completa 100 anos de formado na antiga
Faculdade de Medicina e Farmácia do Rio de Janeiro.
sexta-feira, 25 de janeiro de 2013
CÓPIA DO OFÍCIO QUE O PADRE ROLIM ESCREVEU AO PRESIDENTE DO CEARÁ EM 19 DE NOVEMBRO DE 1868
Ilmo. Sr. Presidente.
Na digna pessoa de V.Excia., respeito a primeira
autoridade da província. De- sejo que V.Excia. se digne
prestar-me um pouco de atenção sobre o que passo a expor. A- cho-me,
presentemente, nesta comarca do Crato, e seja qual for a minha pátria, a minha
idade, a minha capacidade, a minha disposição, desejo pres- tar-me a serviço de meu país, enquanto a morte não reclamar os
seus direitos sobre mim. Este maravilhoso Cariri, atravessado de noroeste a sueste por uma ramificação da grande serra que aqui
tem o nome de Araripe é em muitas partes regado por águas cristalinas que, em torrentes mais ou menos
abundantes, arrebentam de profundos vales nas
encóspias (sic) da serra e formam arroios donde os
habitantes industriosamente extraem córregos
ou levadas de água para as suas lavouras durante a seca. As faldas da serra
constando de terras ora arenosas, ora argilosas
e sempre boas para toda sorte de vegetação, têm a
vantagem de poder ser favorecidas d’água na
estação seca; e é para lamentar que tais terras não estejam cobertas de
videiras, árvore do pão, oliveiras, figueiras, árvore de leite, chã da índia, cacau, tâmaras, sagu, as quais
aqui se alimentam mui bem, como tem sucedido às outras árvores exóticas que aqui vemos e que vegetam tão bem como as indígenas do Cariri. Decerto a indústria europeia teria melhorado muito bem uma tal terra, onde ao tempo da
seca correm regatos de boa água em tal abundância que chegam para regar
extensas campinas. 0 solo produz bem toda a qualidade
de cereais que aqui se tem plantado. Eu
acho-me agora na diligência de experimentar uma plantação de trigo, trabalho este que empreendo com o fim de
induzir os fazendeiros do campo a fazerem alguma cultura desse importante gênero. Visto que V.Excia. é quem presentemente tem em
seu poder os destinos desta
Província, a quem, senão a V.Excia. devemos nós recorrer? Sei que esta
requisição não está isenta de ser taxada de intempestiva e até absurda e para
V.Excia. escusada, uma vez que bem conhece as circunstâncias atuais, as necessidades
da Província, as localidades e propriedades dos terrenos; todavia, é urgente
que nós sejamos importunos em busca de melhoramentos, e se V.Excia. quiser ter
a bondade de atender a esta humilde declaração, a minha esperança a tal
respeito não ficará frustrada; porque então V.Excia. dará as providências necessárias
e munindo-se de autorização pela Assembleia provincial, em razão da despesa,
requisitará da Sociedade Auxiliadora da Indústria do Rio de Janeiro aquilo que
agora pedimos como mais necessário. Pelos nossos sertões já se vai plantando algum
trigo, porém o trigo que me parece preferível a todos é o sarraceno ou negro
que se planta nos Estados Unidos, no Rio de Janeiro já a Sociedade Auxiliadora
da Iedústria tem dado sementes!
Alguns moinhos
que se têm empregado para alguma trituração de trigo são impróprios para isso;
portanto, é necessário mandar vir da América Inglesa algum moinho excêntrico,
ou capaz de triturar bem. As vides que devem servir para o fabrico de vinho no
nosso país são do gênero Vitis labrusia, sendo preferível a espécie Catawba,
que se cultiva em grande escala nos Estados Unidos. Quanto ã oliveira, será difícil
transplantá-la, mas não creio que seja impossível. A árvore-vaca, ou de leite,
que ê indígena na Venezuela, se já não há na Caiena inglesa e holandesa, será
pela dificuldade de propagar-se.
Em suma, os
nossos objetivos de en- comenda reduzem-se a sementes de trigo ne- gro ou
sarraceno, um moinho excêntrico, se- mentes ou pés de Catawba, e repentões (sic) ou
pés de oliveira.
De V.Excia.
súdito respeitado e capelão
Inácio de Sousa
Rolim
Cidade do Crato, 19 de novembro de 1868
sábado, 19 de janeiro de 2013
Íracles Pires - 80 anos.
Dia 15 de
janeiro de 2013; se tivéssemos prazer de tê-la conosco, minha mãe, Dona Íracles
Pires (D. Ica), estaria completando oitenta anos, mas quis o destino que ela
tivesse sua obra abreviada de forma trágica em 1979.
Ela era
oriunda da família Matos Rolim, cujas origens remontam aos fundadores dessa
cidade, mas por conta de seu pai, o Engenheiro Adriano Brocos de posteriormente
pelo casamento com Dr. Waldemar Pires adquiriu os nomes com os quais que iria
ser conhecida na nossa comunidade e fora dela, apesar de que ela mesma achasse
que a fama de sertanejo “nunca ultrapassa a primeira porteira fiscal”, mas,
pelo mais que passa o tempo, ela teima em continuar atual.
Vamos
relembrar alguns aspectos para embasar o que estou afirmando: Ssem querer usar
e expressão evangélica “naquele tempo”, relembro uma conversa que assisti de
minha mãe com Sr. Leitão (Francisco que recentemente li as memórias de seu
irmão Deusdedit e soube que SEU LEITÃO tinha o carinhoso apelido de CHICOLA).
Mas retornando ao motivo desse artigo, ele era secretário da prefeitura na
gestão se me recordo bem, Dr. Quirino, e comentava que a Aeronáutica tinha
exigido algumas obras para que o antigo aeroporto não perdesse a homologação, e
Leitão respondeu, um tanto profeticamente: "D. Ica, se cassarem, a gente constrói outro” ao que ferrovia ela
respondeu de modo igualmente profético: ‘Outro, Leitão, só acredito pegando,
nem vendo’”. Não sei se foi nessa época, mas depois de mais de trinta anos,
minha mãe octogenária ainda não poderia, pegar, pois apesar da enorme e impressionante
obra feita as saída oeste da cidade, o que está lá e oficialmente um campo de
pouso, a homologação ao ainda está porvir sempre é bom relembrar a promessa de
campanha do Senador Vitalzinho, a ligação da Ferrovia Transnordestina até João
Pessoa, que colocado pelo senador no plano plurianual, nossa “querida presidenta”
nos fez o favor de vetar e ninguém se manifestou, se fosse viva, ela certamente
trataria desse assunto com o interesse que está a merecer, fomos desprezados,
tratados como estrangeiros no nosso próprio país e todo mundo fica naquela
omissão criminosa, a se contentar com as esmolas dos programas sociais.
Esses são
pequenos exemplos marcantes na breve, mas produtiva vida de D. Ica, na ocasião
surgisse uma ideia; algumas ela tinha e o teatro que vai ser reformado (??) leva
seu nome está ai para provar, ela encampava ou liderava e não importava quem
estivesse ao seu lado, podiam ser gregos ou troianos, quem quisesse, ou pudesse
ajudar ela estava a frente de tudo que pudesse acrescentar a sua terra e sua
gente. Continua atualíssimo o seu exemplo.
Provavelmente
não seria por acaso que quinze dias antes de seu aniversário, a primeira mulher
toma posse como prefeita de nossa cidade; tanto aqui, quanto onde ela está,
poderíamos considerar um bem vindo presente. Se viva e octogenária, ela,
juntamente com todas as mulheres cajazeirenses se consideraria homenageada.
Fica o
registro dessa data, que deve ser relembrada por nós, seus descendentes, e por
toda a nossa comunidade, quem fez em vida, deve ter seus feitos proclamados
depois de mortos, é nossa memória, o que nós humanos nos distinguimos dos
irracionais, apesar de determinadas vezes sermos tão parecidos...
Saulo Péricles Brocos Pires -Engenhe!ro Mecânico, filho de íracles Pires, residente em Cajazeiras
Hoje seu Leitão faria 95 anos de idade!
As Pernambucanas do Seu Leitão |
Seu Leitão das Pernambucanas é um cajazeirado que marcou história na terra do Padre Rolim pela sua figura carismática e original. Seu Lei- tão era o gerente das Pernam- bucanas, portanto era de espetar uma figura bitolada, voltada to- talmente ao emprego, até por pertencer uma rede de lojas co- nhecida pelo caráter altamente burocrático, as Pernambucanas era famosa, era a maior rede de lojas do Brasil. Onde havia uma cidade de médio porte havia uma loja Pernambucana. Mas seu Leitão, sem descuidar de suas obrigações funcionais, não deixou de participar ativamente da vida cajazeirense: nos meios sociais e políticos. Aliás, seu Leitão e Dona Benvida sua inseparável companheira do lar.
Seu Leitão |
Nascido em 19 de janeiro de 1918, em Brejo do Cruz, chegou a Cajazeiras com apenas 3 anos de idade, teria hoje se ainda contássemos a sua presença física faria hoje 94 anos.
Seu Leitão foi o eterno gerente das lendárias lojas Pernambucanas quando substituiu o Sr. José Alencar. Es- te emigrou para Fortaleza e criou uma portentosa rede de lojas de móveis e eletrodomésticos. Se seu Leitão não tivesse tanto amor à Cajazeiras e seguisse o exemplo do seu antecessor talvez, com a experiência de tantos anos de Pernambucanas tivesse deixado para os filhos um patrimônio bem mais robusto.
Leitão e D. Benvinda, esta foi homenageada com o nome de uma rua no Bairro Jardim Oásis |
Mas o seu patrimônio maior foram os seus filhos que com a sua esposa Benvinda lhe deram esmerada educação: Deusdeth, médico e homem público, com uma grande folha de serviços prestados a Cajazeiras; Roosevelt, assessor da Câmara dos Deputados, em Brasília e Getúlio, empresário bem sucedido na cidade de João Pessoa.
Hoje temos o prazer de lembrar esta data tão cara à nossa história para que os mais novos cajazeirenses não esqueçam esta figura indelével da terra do Padre Rolim.
José Antonio de Albuquerque assim nas suas esmeradas crônicas:
“Com o falecimento de Francisco de Vasconcelos Leitão, conhecido popularmente como Leitão, aos 87 anos de idade, morre um dos últimos símbolos mais representativos da história da cidade de Cajazeiras.
O casal com a amiga D. Teresa Rolim |
A sua vida foi sempre voltada em de- fesa dos interesses maiores da cidade. Em vida era o único sócio fundador vivo do Rotary Clube de Cajazeiras, criado no dia 11 de julho de 1948. Era a única e última te- stemunha viva da cé- lebre reunião realizada no Hotel Oriente, presidida pelo médico Deodato Cartaxo, inaugurando o Rotary Clube de Cajazeiras, que este ano completou 57 anos de existência.
Leitão era um entusiasta do Rotary Clube, trazia dentro de si um dos grandes lemas deste clube de serviço: “mais se beneficia quem melhor serve” e primava pela melhoria da comunidade pela conduta exemplar de cada um na sua vida pública e privada. Foi através das mãos de Leitão que ingressei no Rotary Clube de Cajazeiras, no dia 22 de fevereiro de 1971. Ter sido afilhado de Leitão, para mim, sempre se constituiu num grande orgulho, principalmente por ele ter sido um dos fundadores do Rotary de Cajazeiras. O grande companheiro Leitão, além de ter participado de quase todas as funções no Conselho Diretor, foi presidente deste Clube no período 1962/1963.
Em reunião no Tênis Club |
Uma das marcas mais representativas de Leitão está associada às Casas Pernambucanas. Não se podia falar nesta loja, sem antes lembrar esta figura que a simbolizava e seu nome era mais forte do que a casa comercial que ele foi gerente por 33 anos consecutivos.
Como homem público serviu a Cajazeiras com muito desvelo e abnegação, tendo sido secretário municipal na ad- ministração de Francisco Matias Ro- lim e ainda quando da grande luta para instalação de uma companhia telefônica em nossa cidade, Leitão foi conduzido, por mérito, a ser diretor da Companhia Telefônica de Cajazeiras.
Seu filho Roosevelt, assessor parlamentar no Congresso Brasileiro |
Era um homem que participava de todas as lutas para carrear obras e benefícios para nossa cidade, sempre ao lado de Chico Rolim, Monsenhor Vicente Freitas, Raimundo Ferreira, Wilson Ro- drigues e outros. Esteve presente na luta pelo telefone, pelo abas- tecimento d´água, na volta do trem, pelo sinal de televisão, na luta pelo aeroporto. Participava de todas as festas sociais da cidade ao lado de sua grande companheira e brava mulher Benvinda Leitão. Sempre foi um grande defensor do Cajazeiras Tênis Clube, inclusive pertenceu à sua diretoria durante muitos anos.
Propaganda da Loja Pernambucana de 1957 |
Cajazeiras perde um dos símbolos maiores de sua história..."
Jubileu de Prata do Bispo de da Diocese de Cajazeiras PB, D. Zacarias Rolim
O prefeito Francisco Matias Rolim e seus abnegados secretários, dentre eles o nosso homenageado Francisco Leitão, fazem uma visita ao então Bispo de da Diocese de Cajazeiras PB, D. Zacarias Rolim pelo Jubileu de Prata deste clérigo que exercia o governo espiritual da nossa diocese histórica fundada em 1914, a primeira diocese da Paraíba.
sexta-feira, 18 de janeiro de 2013
Subsídios para a História do Padre Rolim (Professor Antonio de Sousa)
Crônica do Professor Antonio de Sousa
Sob o título: HISTORIA NATURAL de autor sertanejo, editada em 1881, J. DE FIGUEIREDO FILHO (foto), Crato - Ceará, publicou, em setembro de 1973, na Revista Brasileira de Medicina - Vol. 30 – N0 9, importante trabalho de análise histórica sobre "a evolução relativa do Nordeste, nos últimos tempos".
J. DE FIGUEIREDO FILHO, em sua
análise, afirma que "está ainda
longe o momento dessa região sacudir o jugo do subdesenvolvimento". E,
aprofundando o seu pensamento, ele diz: "Não há, porém, motivo para desânimo. Alguns de seus trechos começam
a progredir intensamente e o nordestino, em geral, não é infenso à civilização.
Tem ânsias até de melhorias. Basta simples exemplo, ã guisa de teste”.
Edifício da Fundação Cultural J. de Figueiredo Filho no Crato CE |
"Quando comecei o aprendizado das primeiras letras, havia, em minha
cidade natal, apenas três escolas públicas primárias e outra particular. Há agora oito grupos escolares,
superlotados de alunos, no perímetro urbano, várias escolas reunidas e cerca de
duzentos e cinquenta isoladas, na zona rural. Treze ginásios funcionam na sede
municipal, duas faculdades de ensino superior, além de outras tantas em formação,
afora estabelecimentos de cunho profissional"
Desdobrando sua análise histórica,
J. de Figueiredo Filho faz uma interrogação dando a respectiva resposta: "O que era que acontecia, em épocas passadas,
neste Nordeste secas periódicas sem qualquer remédio, cangacerismo político e a
mais crassa ignorância". Figueiredo Filho, enfatizando acrescenta:
"Mesmo em ambiente assim, surgiam núcleos de irradiação de instrução e de
cultura, a lutarem tenazmente contra as mazelas do meio, a fim de modificá-lo
para melhor".
Depois de uma breve digressão sobre a excursão do viajante britânico George Gardner, em 1839, nos ínvios sertões
do Piauí, "que surpreendeu-se em
deparar-se, em Boa Esperança, simples fazenda de Jaicós, com a inteligência”
Com frequência multiforme do
Dr. MARCOS MACEDO, que fizera seus primeiros estudos ali mesmo, naqueles ermos, em Colégio bem orientado pela
abnegação e competência do Padre MARCOS DE ARAÚJO CHAVES FIGUEIREDO FILHO
focaliza a nossa terra, a terra do Padre ROLIM. "Na fazenda Cajazeiras, Paraíba do Norte, presentemente transformada em
cidade, nasceu outra figura pioneira, que se projetaria, nos sertões
nordestinos, de maneira admirável, pelo seu saber e devotamente pela causa da
educação. Foi o Padre INÁCIO DE SOUSA ROLIM que criou educandário, naquelas
paragens, de atuação marcante em vasta zona sertaneja. Não se contentava só ao
currículo das aulas, como também fazia pesquisas e produzia livros para uso
escolar. Era autor de uma gramática da língua grega adotada por muitos
estabelecimentos de ensino do país".
"Na biblioteca do Instituto Cultural do Cariri, em Crato, há velho compêndio
de História Natural, edição de 1881, para o ‘entretimento dos alunos’, como diz
modestamente o autor Padre INÁCIO DE SOUSA ROLIM, Foi impresso na Paraíba,
capital da Paraíba do Norte, agora com o topônimo mudado para João Pessoa, pela
Tipografia Conservadora, à rua Visconde de Pelotas, 24".
Figueiredo Filho faz ponto na
sua definição sobre a História Natural do Padre Rolim, prometendo demorar-se
sobre esse livro didático, em linhas mais abaixo.
Em seguida, passa a dissertar
sobre a fundação do Seminário São José,
no Crato, em pleno centro geográfico do Nordeste, grande
empreendimento levado a efeito pelo primeiro Bispo do Ceara - D. LUIS ANTONIO
DOS SANTOS que, por duas vezes, "percorreu
a cavalo a distância de quase cem léguas, entre Fortaleza e Crato. A finalidade dessa casa de educação
religiosa era modificar o ambiente pela luz da instrução e formar sacerdotes,
alicerçados em sólida cultura e na fé". O vasto prédio que edificou
ainda hoje domina a cidade, com sua imponência. O ilustre prelado logrou ver
seu empreendimento coberto de êxito. O Seminário do Crato formou as elites que,
mais adiante, fariam a renovação cultural e educacional da zona.
Figueiredo Filho menciona
Canindé, também no Ceará, "onde os
capuchinhos fizeram outra obra de grande repercussão no interior cearense o seu
colégio que abrigava centenas de estudantes pobres".
“Tanto
de Cajazeiras, como do Crato e Canindé, saíram numerosos sacerdotes, em menor
quantidade médicos e agricultores com base melhor para vencerem em suas respectivas
profissões.”
Depois de se alongar em sua
apreciação sobre a evolução da obra educacional e cultural implantada nos
sertões do Nordeste, através dessas três cidades - Cajazeiras, Crato e Canindé-,
Figueiredo Filho, conforme prometera linhas acima, volta ao assunto da História
Natural do Padre Rolim.
"Agora tomemos o fio da meada, voltando para a História Natural, do
Padre Inácio de Sousa Rolim. É escrita
em linguagem clara, acessível ao nível intelectual de qualquer aluno secundário".
"Demonstra o alto grau de conhecimentos humanísticos do autor. A pag. 6
evidência do valor incontestável da História Natural, em múltiplas atividades
humanas, incluindo a medicina: ‘A importância prática das ciências ê muito
evidente para que tenhamos necessidade de demonstrar. Para isso nos
convencermos basta lançar os olhos em roda de nós; pensar nas riquezas ocultas
no seio da terra, e nos serviços que a Geologia e a Minerologia dão cada dia a
nossa indústria; ver as plantas tão variadas e tão belas que servem com uma
magnífica prodigalidade, sendo a História Natural a que deve seguir de guia à
agricultura; enumerar esses animais que nos dão carne, a lã, a seda e o mel;
que nos prestam certa força de que nós carecemos; ou que bem longe de nos ser
úteis como as precedentes, destroem colheitas etc. recordar-se enfim a longa
série de enfermidades de que a máquina humana é muitas vezes atormentada; e bem
convencer-se desta verdade que a Medicina se agita como cega, todas às vezes
que não se apoia sobre o estudo científico da natureza humana".
Estuda, com poder de síntese admirável,
classificando-os, os animais, vegetais e minerais. Enumera os 54 elementos
conhecidos, até então, confundindo-os com corpos simples, ã maneira da Química
do tempo. Erudito, conhecedor do latim e do grego, não esquece de dar, em
notas, no fim de cada página, a origem do nome de famílias, ordem etc. em
Botânica ou Zoologia. Exemplifiquemos: "Digitogrados forma-se do Latim - Di gitus: dedo e Gradior: - marchar,
porque eles marcham apoiando no chão somente os dedos. Ornithoríneo é palavra
do grego Opvis, Opvitos - pássaro, Goyssas - bico".
Dá a origem histórica das ciências
naturais a começar pelos estudos de Aristóteles, até o momento quando escreveu
aquele útil livro que não serviu unicamente aos seus alunos de Cajazeiras, mas
a outros educandários do Norte. Sua cidade muito lhe venera a memória,
dando-lhe o nome a rua, instituições e erguendo-lhe estátua.
Ruínas do Engenho D'água na localidade de Lameiro - Crato/CE |
Dizem que um seu irmão, Dr. ROLIM,
residia em terras cratenses. Era professor de letras e meio amalucado e por
isso os pais não lhe confiavam as filhas e unicamente os meninos. Na seca de
1877, a doença mental o atacou mais intensamente, como sucede em tempo de
calamidade. Tornou-se até grande benfeitor dos retirantes. Organizou grupo, em
sistema militar, ainda sob influência da guerra do Paraguai. Saia pelos sítios
a fora com seu grupo de esfarrapados, em marcha cadenciada, ã cata de esmolas. Distribuía-as
equitativamente, minorando assim o sofrimento daquela pobre gente. Procedia
melhor do que o comum dos mortais, de juízo mais equilibrado do que ele.
O Padre Inácio de Sousa Rolim
nasceu em 1800, na fazenda Cajazeiras, propriedade de seus genitores, o
cearense Vital de Sousa Rolim e consorte - D. ANA ALBUQUERQUE. Estudou em
Recife e firmou seu nome ali, na qualidade de professor. Em 1843, fundou o
colégio que se notabilizou em todos os setores nordestinos. Foram seus alunos o
Cardeal Arcoverde e o Padre Cícero Romão Batista. A fazenda cresceu em torno do
educandário e da capela que sua genitora edificou. É agora das cidades mais
cultas e prósperas do interior nordestino.
Vista atual da cidade do Crato do Lameiro, hoje uma vila. |
O padre Inácio de Sousa Rolim
foi um dos grandes construtores da civilização nordestina. O documento que
dirigiu ao presidente ANTONIO MARCELINO NUNES GONÇAL- VES mostra das belas facetas
de seu espírito privilegiado.
Anexo, em separata, cópia
autêntica do ofício que o Padre Rolim dirigiu ao Presidente da Província do
Ceará, ANTONIO MARCELINO NUNES GONÇALVES, em 19 de setembro de 1868.
Professor Antonio de Sousa
quinta-feira, 17 de janeiro de 2013
Zé do Norte
A nova geração
conhece Lua Bonita pela bela regravação feita pelo maluco beleza Raul Seixas.
No entanto, a música foi originalmente gravada em 1953 por Zé do Norte, autor
da canção em parceria com Zé Martins, para a trilha sonora do clássico de Lima
Barreto, "O Cangaceiro", que foi considerado o melhor filme de
aventura do Festival de Cannes daquele ano. Nesse mesmo filme, Zé do Norte
também lançou Mulher rendeira, outro clássico da MPB. Aliás, mesmo no Nordeste,
esta música é tão enraizada no imaginário coletivo, que a maioria das pessoas a
vêem como herança folclórica, de domínio público e autor desconhecido. A trilha
do filme, que tem parte das músicas de outros autores, em muito contribuiu para
tornar a música de Zé conhecida em todo mundo - Europa, EUA, União Soviética -
já que, na época, a fita foi vista em 80 países e por quase 50 milhões de
pessoas!
Texto de
Enoque Feitosa informa que Alfredo Ricardo do Nascimento, ou melhor, Zé do
Norte (foto), nasceu em Cajazeiras em 18 de dezembro de 1908 e migrou para o Rio de
Janeiro em 1926, ao completar 18 anos. Se vivo estivesse estaria completando,
em 2009, 101 anos de uma vida marcada por intensa ligação com seu povo e sua
cultura e por belíssimas músicas que fazem parte do cancioneiro nacional.
No Rio, na
esteira da afirmação da música nordestina, através de Luiz Gonzaga, em programas
da Rádio Nacional, criada após a Revolução de 30 por Getúlio Vargas, para
estimular a difusão de uma Cultura Nacional-popular, Zé do Norte, foi
descoberto pelo homem de teatro Joraci Camargo, autor de "Deus lhe
Pague" e "Sindicato dos mendigos". Ao lado de outros que na
mesma época eram atraídos pelo Rio, como João Pernambuco, Jaime Florence, (o
Meira, que com o Dino 7 Cordas formou uma das mais duradouras duplas do violão
brasileiro), Luperce Miranda, Jackson do Pandeiro, entre outros, Zé do Norte viu
surgir a grande oportunidade de afirmação de seu talento, tendo nesse período
de 1928 e até o final da década de 50 tido intensa participação na difusão da
cultura e do cantar nordestino, na antiga capital federal.
Zé do Norte
saiu de Cajazeiras praticamente analfabeto. Lá, foi funcionário da limpeza de
um colégio particular e mesmo propondo trabalhar de graça para poder estudar,
não foi aceito por que, conforme lembra nas suas memórias, o então diretor o
informou que "aquele era um colégio exclusivo para pessoas de
família". Mesmo assim, sem chances de obter educação formal, Zé não abriu
mão de adquirir sólida formação humanista, que foi decisivo para vinculá-lo as
suas raízes e produzir uma música bela e evocativa dos sentimentos de sua
gente. Zé produziu cerca de 200 obras musicais, boa parte carecendo de um
trabalho de catalogação. Sua obra é cantada hoje no Brasil e no exterior,
embora nem sempre a fonte seja citada.
No período
mais fértil da carreira de Joan Baez, ali nos anos 60, vários artistas, como
Bob Dylan e a própria Baez foram buscar no folclore americano e na música da
América Latina fonte de inspiração. E é num de seus primeiros discos, o
"Joan Baez 5", que encontramos a "Mulher Rendeira", com o
título de "O Cangaceiro" e com o Zé do Norte com seu nome de batismo
completo, Alfredo Ricardo do Nascimento. Nesse mesmo disco, Baez gravou a
"Quinta Bachiana", de Villa-Lobos.
Na MPB uma
outra canção sua muito conhecida é "Sodade, meu bem, sodade", toada
gravada pela primeira vez por Vanja Orico, em 53. É dele também "Meu
Pião", que gravou em 71 e que tornou-se conhecida na voz de Geraldo
Azevedo. Suas músicas, além de evocativa das coisas sertanejas, têm muito
lirismo, como se vê em "Sapato de algodão ("eu fui dançar/ com meu
sapato de algodão/ o sapato pegou fogo/ eu fiquei de pé no chão"),
Zé do Norte só
voltou a Paraíba quase 60 anos depois, em 1985, para ser homenageado em um
festival cultural. O conjunto de sua contribuição à MPB e as Culturas Nacional
e Regional é imensa e ainda pouco conhecida, sendo utilizada, como é o caso de
"O lobisomem de Cajazeiras", em textos teatrais e novelas de TV, em
nome de outros autores. Ele foi um representante típico daqueles artistas
enquadrados na definição de Tolstoi: "Sou universal ao falar de minha aldeia.
Descreva sua terra e assim estarás descrevendo o mundo todo". Zé morreu em
4 de janeiro de 1992 no Rio de Janeiro.