Quem eram esses Garotos de Ouro? De onde vieram? De um mundo
desconhecido? Da terra? Ou das alturas, de onde não eram vistos? Nada disso!
Eles eram do nosso meio, das nossas glebas sertanejas, de lugarejos
pobres. A diferença estava na vontade de vencer. Na vocação sacerdotal.
A faixa etária era mais ou menos a mesma. Alguns já vinham com
experiência do Pré-Seminário de Patos. A maioria estava cruzando as portas de
um internato pela primeira vez. Des- confiados, trêmulos, encabulados, ti- midez à
flor da pele, esperando uma mão amiga, para não perder vocação logo no primeiro
dia.
À primeira vista, um local completamente desconhecido, longe da cidade,
dava a impressão de verdadeiro esconderijo.
Primeira noite: saudade "matadeira”, choro na cama, olhares diferentes,
pouca amizade, e o sono sem convencer. Os pré-seminaristas vindos de Patos,
cabeça feita, ditando normas, dizendo aos novatos que tivessem cuidado com os
experientes, prestigiados pela cúpula do Seminário.
Logo nos primeiros dias, os apelidos começaram a surgir. Era uma dor
danada; não havia como denunciar o fato à mamãe ou ao papai, eles estavam
longe. No dia seguinte, as primeiras provas escritas, com fiscalização rigorosa
pelos padres e professores de cara fechada.
As orações na Capela começavam a alegrar os garotos. Refeições de boa
qualidade, em silêncio absoluto, até que o Padre Reitor desse o sinal. As
orações, antes e depois das refeições, davam a mostragem (sic) do que seria a
preparação para os caminhos sacerdotais.
As primeiras confissões, em filas intermináveis, a penitência diante da
Virgem da Assunção, os cânticos ensaiados e dirigidos pelo Padre Antônio
Lisboa que sabia tudo de música e mais alguma coisa. As grandes mãos espalmadas
do maestro, bem à frente dos alunos, indicavam como seria o trabalho no
ensinamento dos primeiros acordes na velha “Serafina”. Uma coisa confortava a
todos: a paciência do Padre Lisboa, corrigindo tudo com a excelência das boas
maneiras. Identificava de longe uma voz desafinada. Chamava e corrigia. Se não
conseguisse melhorar a voz do jovem aprendiz de cantor sacro, imediatamente o
excluía da sua relação de coralistas (sic). A expulsão era uma dor fina e
aguda. A gozação dos colegas era o que mais doía. No final, todos foram
vitoriosos. Cinquenta anos depois, os currículos comprovam o fruto da
perseverança.
As paróquias se dividiam, normalmente, dentro do Seminário. Os
seminaristas de cada cidade se uniam; isso significava uma força maior para
melhorar o astral nos primeiros dias. Não demorou muito e os vigários começaram
a chegar para as visitas aos seus recomendados. Ouviam queixas, davam
conselhos e, na despedida, as lembranças para os familiares.
Inegavelmente, cada seminarista representava o orgulho de sua cidade, do
seu distrito, do seu sítio. Os familiares que lá ficavam esbanjavam confiança
e alegria. Nas férias, eles já se comportavam como verdadeiros ministros de
Deus, rezando nas casas, capelas, matriz das paróquias; ajudando nas missas,
batizados, casamentos; participando ativamente das santas missões, muito comuns
naqueles tempos.
ESPORTE
O esporte foi incentivado peia direção do Seminário. Material esportivo
não faltava. Futebol de campo, voleibol, espiribol faziam o maior entrelaçamento
entre os seminaristas.
Ninguém podia se sentir pequeno demais, tinha que enfrentar os mais
experientes, de igual para igual, pois quem quer ser líder no futuro tem que
ser forte no começo. Quem pensar em conquistar medalha de bronze não passa de
comenda de flandre.
Um dos momentos marcantes para todos os que passaram pelo Seminário foi
a construção do campo de futebol, localizado ao lado direito da parte onde fica
o refeitório, já perto do açude. A maioria gostava de jogar e abraçou a ideia
de ter o seu próprio campinho. Os seminaristas enfrentaram o trabalho na
chibanca, picareta, enxada e, em poucos dias, estava lá, prontinho, o campo
para os treinos e jogos, de acordo com a programação da Reitoria.
ORDENS
DA REITORIA
As ordens da Reitoria eram fortes. A obediência tinha que ser cem por cento.
Quem desobedecesse receberia o castigo merecido; se continuasse, podia até ser
expulso. Para ser Padre, era mister ganhar medalha de ouro.
Logo nas férias, os garotos davam o recado para que vieram. Os vigários
paroquiais se encarregavam de fiscalizar o comportamento dos seus seminaristas.
Dançar e namorar estavam fora do
comportamento religioso de cada um. A visita aos vigários, participação
nas atividades religiosas da Paróquia ou Capela eram obrigatórias. No final do
período de férias, todos apanhavam o primeiro carro ou trem, ansiosos pela
volta, na certeza de que, na Colina do Assunção, estava o caminho da vitória.
Os vigários de cada Paróquia encaminhavam, no final do recesso escolar,
um boletim informando toda a participação do seminarista na Igreja e,
especialmente, o seu comportamento diante dos paroquianos e do seu vigário.
O aprendizado escolar era importante, mas o cumprimento rigoroso das
normas disciplinares daquela Casa de Formação era obrigatório, como prova de
resistência na caminhada para o futuro.
O Monsenhor Luiz Gualberto, primeiro Reitor, seguia o caminhar de todos
os seus alunos. Ensinava, orientava, castigava, cuidava da saúde, alimentava,
celebrava, abria as portas para a felicidade futura.
A batina preta era a fortaleza dos seus comandados. Ele impunha ordem e
respeito. Recebia os pais dos alunos com muita fineza e educação. Tratava a
todos dentro da mesma igualdade. Fiscalizava as cartas enviadas aos
seminaristas e examinava as merendas que os familiares encaminhavam para o
Seminário. Lá não se estudava somente letras e aritmética. Era um estudo
completo: religião, higiene, educação alimentar, civilidade, companheirismo, a
maneira de vestir, o comportamento em sala de aula e a forma de viverem
comunidade.
A FESTA DA
PADROEIRA
A festa da Padroeira, Nossa Senhora da Assunção, era celebrada com
pompas. O dia 15 de agosto, feriado especial, festeja-se com intensa
programação: missa às dez horas da manhã, como preparação para as grandes
solenidades, merenda, almoço e jantar reforçados. Madre Rosa, coordenadora da
cozinha, abria a mão nesse dia, do qual muitos convidados especiais
participavam.
O APOIO DAS
FREIRAS
Como falar do Seminário sem destacara Madre Rosa e a Irmã Isabel?
A primeira, rígida demais; a segunda, uma doçura em pessoa, no trato
com todos. Sem elas, o sucesso não seria total.
Hoje, já velhinhas, ainda relembram os idos de 1955.
Madre Rosa foi escolhida para uma função que exigia disciplina, uma
espécie de Ministra da Economia Alimentar. Nem sempre estava disponível para o
diálogo com os seminaristas e, vez por outra, era dominada pelo sentimento do
mau humor.
Irmã Isabel, essa era diferente. Tratava a todos com carinho. Conversei
demoradamente com ela, no Carmelo. Muito feliz, falou da construção, da
felicidade no velho Seminário. Falou da sua dedicação aos garotos: tratamento
dentário, doenças de pequeno porte, momentos de dores e de saudades dos seus
lares, das terras de origem.
VITÓRIAS E
LAMENTAÇÕES
A prova de que os ensinamentos do Seminário foram de grande valia está
na vida de cada um na atualidade: médicos, advogados, padres, engenheiros,
empresários, pastores evangélicos, jornalistas, bancários, políticos, sucesso
em qualquer profissão. Onde quer que se encontrem, olham, através do tempo,
para o Seminário, a fim de agradecer a qualidade de vida que conquistaram.
A tristeza fica por conta dos que já morreram: não podem mais participar
dos momentos felizes e vitoriosos. Companheiros de luta, muito fizeram por
aquela Casa de Formação e se destacaram nas suas terras de origem, como: Paulo
Correia da Silva, José Félix, Jorge Delfino de Lima, Maurício Pereira Leite,
Odilon Guedes Feitosa, Paulo Targino da Cruz, Jesenê Garcia dos Santos,
Francisco Noronha Vieira, Francisco de Assis Costa, José Marques Dantas, José
Carlos Monteiro, Mário Saraiva de Andrade, Valdemar Pedro de Oliveira, Frutuoso
Alexandre.
A passagem pelo Seminário marcou as nossas vidas, apesar da austeridade
disciplinar. Em compensação, o nível de aprendizado era muito alto. Todo
seminarista detinha uma vontade quase inquebrantável para se tornar vencedor.
Não é por acaso que todos ainda rememoram, com grande entusiasmo, os fatos que
marcaram sua experiência naquela Casa.
O Seminário não era só um local de preparação ao sacerdócio. Era, acima
de tudo, um espaço para construção de bons e novos caminhos. Por conta dessa
abrangência no ensino, na educação e na obediência, a maioria esmagadora dos
seminaristas venceu galhardamente em todas as atividades da vida científica,
social, política e cultural e nas profissões que escolheram.
Além da rigidez disciplinar, a vida no Seminário era feita de momentos
de descontração, lazeres prazerosos, divertimentos e passeios.
APELIDOS
Cada seminarista tinha um apelido, de acordo com a sua postura, o seu
jeito de viver, de ser, de andar, de falar. Os apelidos eram batizados pelos
mais “espirituosos" da Casa. Ai de quem reagisse contra o cognome. Os mais
destacados eram: Prelhá, Mané Palheita, Costinha, Joaquim Queixinho, Chorão,
Ovelha, Padim Abdon, Carretel, Pontaria, Mala Velha, Ferrugem, Chupeta, Burro
Preto, Rato de Igreja, Beato, Boujeste, Caboré, Raposa, O Cego, Bombeiro, Boca
Mole, Fonfon, Imagem de Pau, Timbú, Leirinha e tantos e tantos outros.
O PICOLÉ DE
FEIJÃO
Um dia, durante o café da manhã, o seminarista Constantino Fernandes
dos Santos, de Brejo do Cruz, muito gozador, abriu a geladeira instalada no
refeitório e, antes que Madre Rosa se desse conta, pegou a “tirjina” de feijão,
levantou-a nas mãos, mostrou aos companheiros gritando: “olha o picolé de feijão!”
Madre Rosa, diretora da cozinha, ficou uma “arara”! Comunicou o fato ao
Padre Reitor que, de imediato, repreendeu Constantino, a troco da jura de jamais repetir a façanha de mau gosto.
A convocação para as aulas, refeições, dormida, salão de estudos,
missas, reuniões era feita pelo sino, colocado à entrada da Capela. Logo às
primeiras batidas, todos se colocavam em seus devidos lugares, tomando o rumo
pré-determinado para aquele horário. Ninguém questionava as batidas do
instrumento. Todos sabiam o calendário, com a distribuição dos horários para o
cumprimento dos deveres.
O velho sino encontra-se ainda no mesmo local de 1955. Ele é testemunho
de tudo quanto aconteceu de ontem até hoje.
Um dos objetos de grande valor do Seminário era a Serafina, órgão usado
pejo Padre Antônio Lisboa, para tocar em todos os momentos festivos da Casa:
solenidades religiosas, novenários da Padroeira, missas dominicais. As mãos
mágicas do Padre Lisboa tocavam e encantavam os presentes no teclado da velha
“Serafina”.
A Serafina ainda se encontra no Seminário, numa sala especial,
destinada aos objetos de valor histórico. Já foi de grande utilidade, mas hoje
não é usada.
Conversei demoradamente com o Pe. Antônio Lisboa sobre a velha Serafina.
Ele ainda lembra muito bem o órgão que teve uma presença muito forte em sua
vida. Pe. Lisboa encontra-se, hoje, na Paróquia Nossa Senhora de Fátima, na
cidade de Campina Grande-PB.
O APITO DO
MEDO
Famoso também ficou o apito. O Reitor usava-o no bolso da batina, como
instrumento especial de avisos gerais. Os seminaristas temiam aquele famoso
apito; quando ele soava, começava a tremedeira, alguma coisa inusitada
acontecera.
Por ocasião de uma visita, neste ano de 2005, perguntei ao Monsenhor
Luiz Gualberto se ele ainda guardava o apito como lembrança da sua passagem
como Reitor pelo Seminário. Ele respondeu que não. O apito levou fim.
A VISITA DOS VIGÁRIOS
Um dos grandes momentos era a visita de nossos vigários. Quando eles
chegavam, o Reitor mandava avisar aos seminaristas da sua Paróquia, que tinham
o direito de conversar o tempo que fosse necessário. Recebiam orientações
espirituais do sacerdote, conselhos e notícias da família. Era um dia de
alegria e até de gozações com os outros: “O
meu Vigário veio me visitar, o teu não apareceu aqui!”.
DIVIDIR PARA DISCIPLINAR
Os seminaristas eram distribuídos em “três divisões”, por critério de
idade: maiores, médios e menores. Se havia dois ou três irmãos no Seminário, em
divisões diferentes, só podiam comunicar-se com ordem expressa do Reitor e em
caso de necessidade, sob pena de serem punidos.
Quando os pais chegavam para uma visita, a conversa entre irmãos era
natural; ficavam liberados para conversar à vontade; fora disso, nem
cumprimentos.
OS PREFEITOS
No final de cada mês, o Reitor designava um prefeito para cada divisão.
Assim era chamado aquele que, na confiança do Reitor, recebia a incumbência de
colaborar para o bom funcionamento da disciplina nas três divisões. Os
prefeitos eram instruídos pelo Reitor para mantê-lo informado sobre qualquer tipo
de transtorno disciplinar.
Todos aguardavam com enorme expectativa as nomeações dos referidos
prefeitos e outros auxiliares, como leitor, acólito. As indicações eram feitas
por ocasião do jantar. A nomeação era sinônimo de prestígio junto ao Padre
Reitor.
Quando o escolhido não correspondia às expectativas do Padre Mestre,
nunca mais seria contemplado para função alguma.
MARTIROLÓGIO
ROMANO
Todos os dias, por ocasião do almoço, um seminarista devidamente
designado pela Reitoria, fazia a leitura de um capítulo do livro “O Martirológio
Romano”, narrando a vida dos santos sacrificados em defesa da fé cristã. Todos
tínhamos de ouvir a leitura em silêncio, com a devida e respeitosa atenção.
Do púlpito, que ficava colocado numa das laterais do rèfeitório, para
que todos tivessem a melhor visão do leitor, narrava-se o capitulo do dia. Quem
ousasse conversar ou fazer “ouvido de mercador”, seria advertido pelo senhor
Reitor, através de toques da campainha, que ficava sobre a mesa dos padres.
Assim se mantinha a disciplina, razão maior da nossa formação.
ENCONTRO COM A
FELICIDADE
A partir do primeiro dia em que iniciei esta pesquisa, à busca de
antigos companheiros, passei a reviver o ano de 1955. Os caminhos se abriram
para uma alegria constante. As dificuldades foram enormes. Imaginem encontrar
144 companheiros, espalhados por esse Brasil afora, através de cartas, visitas
e muitos telefonemas. Recorri à Telemar e recebi informações de vários
ex-seminaristas com quem mantinha contato direto.
Muitos foram solícitos, atendendo com presteza e encaminhando os dados
solicitados com brevidade. Outros não enviaram informação alguma e até
criticaram nossa iniciativa. À proporção que as dificuldades aumentaram,
passei a fazer reiterados telefonemas, na ânsia de encontrar, a qualquer custo,
um companheiro onde quer que estivesse.
Momentos aconteceram em que quase abandonei a pesquisa. Ah! não vale a
pena, dizia comigo mesmo. Mas a obstinação me fazia retomar o caminho desse
longo trabalho.
Em uma determinada manhã, com a força gigantesca de quem nunca abandona
a trincheira, alguém desligou o telefone em minha cara. Esse gesto deselegante
fez-me levantar o astral. Jurei que, a partir daquele instante, buscaria a
todos e o fiz incansavelmente.
A MORTE DOS
COLEGAS
Foi realmente uma longa caminhada! Conversando certo dia, por volta das
onze horas da noite, com o companheiro Guy Reinaldo Barreto, de Catolé do
Rocha, fui por ele informado de que o nosso amigo Paulo Targino da Cruz
morrera traído pelo velho coração.
Embalado à procura dos colegas, peguei o telefone e recorri à Telemar,
que me informou o número de um velho amigo, em pleno sucesso profissional
depois da saída do Seminário. Liguei para a sua casa e fui atendido pela
própria esposa. Narrei a razão pela qual estava ligando. Ela, com a voz
trêmula, me disse: “parece que o senhor não sabe de nada”. Retorqui: que
aconteceu? E ela: “Jesenê morreu”. Chocado, continuamos a conversa e ela me
deu detalhes sobre o trágico acontecimento: uma moto tirou-lhe a vida, nas
ruas de João Pessoa.
De outra feita, liguei para a cidade de Patos, procurando José Marques
Dantas. A empregada da casa me informou com voz triste: “ele faleceu há dois meses”. Outro choque emocional. Quase lhe
dizia: “tenha cuidado, que eu sofro do
coração!”.
Quem pode esquecer “Prelhá”? Um garoto simples, humilde, nascido na zona
rural do hoje município de Aparecida, na fazenda Acauã. Mesmo depois de ser
expulso do Seminário, continuou fazendo a sua parte religiosa, organizando a
catequese, pregando nas capelas, participando ativamente das atividades da
Paróquia de Nossa Senhora dos Remédios, em Sousa. A morte, porém, o ceifou
muito jovem. O nosso saudoso Jorge Delfino de Lima deixou muitas saudades. Não
se tem notícia de alguém que tenha encontrado o Jorge com tristeza, cabisbaixo
ou reclamando da vida.
“Ovelha”, um dos mais humildes que o Seminário conheceu até hoje, veio
da “Terra dos Padres”, Uiraúna, para tentar ser mais um ministro de Deus. Era
o Francisco Noronha Vieira, bom amigo, passou mui tas férias na minha residência,
em Lagoa Redonda, município de Sousa. Perseguido por uma doença incurável, a
morte o levou antes de completar os sessenta anos de idade.
ESPIRITUOSOS E
DESCONFIADOS
E Ascânio Abrantes de Carvalho, da cidade de Sousa, filho do Chefe da
12a Ciretran, Simão Afonso de Carvalho? Não deixava ninguém em paz. Com um
simples olhar, caricaturava um companheiro. Encontrava para todos um apelido
adequado. Gozador irreverente, assim era o Ascânio, hoje um gordo bonachão.
No mês de março, numa noite chuvosa, consegui comunicar-me com o
companheiro Valdecy Leite de Andrade, residente em Brasília. Conversamos
demoradamente, expliquei-lhe que estava escrevendo um livro sobre os fundadores
do Seminário. No dia seguinte, mandei-lhe uma carta e outra ao seu gerente, Edmilson
Veras Diniz, também ex-companheiro nosso. Depois de algum tempo sem resposta,
finalmente, no dia 29 de abril, por volta das onze e meia do dia, o telefone
tocou no meu escritório. Atendi. Do outro lado da linha alguém pergunta: “de onde fala? De Cajazeiras”, respondi.
“É de um escritório de advocacia”? Sim! E de onde está falando? Ele disse: “de Brasília”. Aí conheci mais ou menos a
indagação e disse: aqui fala Francisco Alves Cardoso. A voz soou novamente: “Agora tá certo! Eu estou ligando para saber
se, na verdade, foi você que me ligou naquela noite, pois hoje em dia a gente
não pode confiar muito, sem antes pesquisar. O Brasil está assim”.
Gostei do jeito de Valdecy! Afinal de contas são cinquenta anos de
distância.
CENAS QUE NÂO
SE APAGAM
A descida do dormitório, pela madrugada, em carreira “desenfileirada”,
rumo à barragem, localizada por trás do Seminário. Ali, geralmente, um número
exagerado de urubus pousava de asas abertas, ao sol causticante, e não se
espantavam nem mesmo com a chegada dos seminaristas. O banho era gostoso,
apesar de muito cedo e a água muito fria.
Os craques do Seminário, participando das peladas no campinho de futebol
por nós construído. Ozais afirmando ser o melhor do “association”; o Rolim, da
cidade de Cajazeiras, dizia que era um atleta para qualquer equipe da região.
Vanaldo, com classe e pouco futebol.
Como esquecer a “Malaria”? O local mais desorganizado do Seminário,
onde as malas eram colocadas de todo jeito, resto de merenda fedendo, papéis
soltos por toda parte, e a eterna vigilância de todos, com relação ao que era
guardado nas malas novas e bonitas, daqueles que tinham melhores condições
financeiras; e as malas velhas desajeitadas, dos mais pobres.
O recreio de todas as noites, após o jantar, em frente ao prédio do
Seminário. Os grupos se formavam, geralmente por alunos de cada Paróquia.
Discussões, planos para as férias, lamentações pelas saudades da família e os
fuxicos inevitáveis. Tudo isso parava ao tocar do sino, quando todos seguiam
rapidamente para o salão de estudos.
As gozações com os acólitos que erravam algumas partes dos rituais
religiosos, quando estavam ajudando nas missas. Quem errava, passava o resto do
dia sendo gozado pelos colegas. Todo final de semana, o Padre Reitor designava
dois seminaristas que participavam das missas diárias.
O Monsenhor Luiz Gualberto de Andrade nasceu na cidade de Uiraúna, no
dia 14 de outubro do ano de 1921. Filho do casal José Gualberto de Andrade e
Francisca Romana de Andrade.
Foi ordenado sacerdote pelo bispo Dom Luís do Amaral Mousinho, na Matriz
de Nossa Senhora da Guia, na cidade de Patos, no dia 04 de dezembro de 1949. Foi
Vigário Coope-rador de Patos nos anos de 1950 e 1951. Vigário Cooperador de
Itaporanga, de 1952 a 1954. Vigário Ecônomo da Paróquia de Santana dos
Garrotes, de 1952 a 1955. Capelão do Colégio Padre Diniz, em Itaporanga, de
1952 a 1955. Pároco de Itaporanga, de 1954 a 1955. Primeiro Reitor do Seminário
Nossa Senhora da Assunção, de 1955 a 1958. Consultor da Diocese de Cajazeiras,
de 1955 a 1982. Vigário Ecônomo de São José de Piranhas, em 1956. Diretor do
Ginásio Diocesano de Pombal, de 1959 a 1967. Fundador e Diretor do Instituto
Profissional Monsenhor Valeriano, de Pombal, de 1960 a 1967. Diretor do Abrigo
da Mãe Pobre de Pombal, de 1959 a 1967. Diretor Provedor do Hospital
Maternidade “Sinhá Carneiro”, de Pombal, de 1959 a 1967. Fundador e Diretor do
Colégio Comercial de Pombal, de 1961 a 1967. Diretor do Liceu Paraibano, de
João Pessoa, no ano de 1969. Primeiro Diretor da Faculdade de Filosofia,
Ciências e Letras, de Cajazeiras, de 1969 a 1993. Vigário da Paróquia de Nossa
Senhora da Piedade de Cajazeiras, 1969 a 1976. Diretor do Colégio Diocesano
Padre Rolim, de Cajazeiras, de 1972 a 1991. Fundador e Diretor do Curso
Técnico em Enfermagem do Colégio Diocesano Padre Rolim Cajazeiras, de 1975 a
1979. Capelão do Colégio Nossa Senhora de Lourdes, de Cajazeiras, de 1977 a
1992. Coordenador do Campus V da UFPB, Cajazeiras, nos anos de 1979 e 1980.
Primeiro Diretor do Centro de Formação de Professores - Campus V da UFPB -
Cajazeiras, em 1980. Vigário da Paróquia de Nossa Senhora do Rosário São João
do Rio do Peixe, de 1980 a 1992. Vigário da Paróquia de Santa Helena, de 1980 a
1983. Diretor da 9a Região de Ensino de Cajazeiras, nos anos de 1982 e 1983.
Diretor do Colégio Nossa Senhora de Lourdes, de Cajazeiras, de 1984 a 1990.
Capelão do Instituto Monte Carmelo Cajazeiras, de 1992 até a data de hoje. Foi
nomeado Cônego Penitenciário, pelo Bispo Diocesano de Cajazeiras, em 1995. Foi
nomeado Monsenhor por S.S. o Papa João Paulo II, no dia 14 de janeiro de 2002.
NOSSA SENHORA
DA ASSUNÇÃO PADROEIRA DO SEMINÁRIO
O Monsenhor Luiz Gualberto gosta de explicar porque a Virgem da Assunção
foi escolhida como Matrona do Seminário
“O
Sr. Bispo Diocesano, Dom Mousinho, foi recebido .por Sua Santidade o Papa Pio
XII, quando teve a oportunidade de pedir ao Santo Padre para benzer a pedra
fundamental do Seminário e também o nome da santa padroeira daquela Casa de
Formação. Naquele ano, aproximava-se a definição do dogma de Nossa Senhora da
Assunção, e o nosso querido Bispo Dom Luís do Amaral Mousinho, para unir-se
cada vez mais ao Santo Padre, disse que escolheria como Padroeira o nome de
Nossa Senhora da Assunção, cuja definição do dogma seria feita por Sua
Santidade. Com a bênção do Seminário, feita lá em Roma, o Santo Padre benzeu
também a pedra fundamental do querido Seminário”.
O QUE PENSA O
CÔNEGO GUALBERTO SOBRE O SEU REITORADO
“Sem dúvida nenhuma, não tenho
palavras para dizer quais recordações eu tenho do Seminário. Mas, certamente,
são literalmente incontáveis aqueles momentos felizes, aqueles dias e aqueles
quatro anos abençoados em que tive a honra de dirigir, graças à bondade e à
dedicação extrema de sua Exa. Revma., de saudosa memória, D. Zacarias Rolim de
Moura. Foram quatro anos abençoadas e gratificantes, que Nosso Senhor concedeu
na minha vida, de ter contato com a turma e ter tomado conta dos fundadores do
Seminário, que não se ordenaram tantos, mas ordenou-se algum número, mercê de
Deus, a inteligência, o talento e a dedicação de todos eles. Cresceram na sua
vida intelectual, depois na sua vida profissional e também na sua vida
familiar, dando às suas famílias um testemunho de fé, de amor a Deus, aos seus
irmãos e irmãs, em seu cotidiano existencial e na luta que eles praticam na
verdade, na justiça e no amor. Realmente, para mim, é um momento gratificante,
vendo a comunidade repleta de alegria para celebrar a festa do dia 15 de
agosto, Cinqüentenário do Seminário Diocesano. Graças a Deus, daquele tempo da
fundação eu tenho a alegria de contar que todos esses ex-alunos, embora não
tenham seguido a vocação sacerdotal, seguiram outros caminhos, outras
vocações, nas quais eles estão realizando e realizaram proficuamente as suas
atividades. A1a turma de alunos fundadores, vale a pena uma revisão no
calendário, pois vemos tantos deles que foram e são felizes na sua vida.
Alegria, muita alegria. Saúdo esse meu querido ex-aluno, que não seguiu a
vocação sacerdotal, deixando o Seminário, mas se formou em Direito e é um jornalista
de grande categoria, o nosso querido Dr. Francisco Alves Cardoso”.
.
O Monsenhor Gualberto fala com entusiasmo sobre o verdadeiro papel de
Dom Zacarias Rolim de Moura na construção do Seminário.
O fundador do Seminário foi, na verdade, Dom Mousinho, mas Dom Zacarias
foi quem concluiu a obra, quem a inaugurou, e quem fez tudo pelo Seminário,
mantendo os alunos, oferecendo-lhes o necessário. Eu sou testemunha daqueles
quatro anos; ele jamais negou qualquer favor a quem quer que fosse, tratando
sempre de fazer o bem ao Seminário e aos seminaristas. Ele dizia continuamente
o seguinte: “Nós não podemos viver sempre
de bacia na mão”. Daí porque começou a construção de todas as casas que
hoje fazem parte do patrimônio da nossa Diocese e que atingem um total de cinquenta
e quatro moradias e alojamentos. Dom Zacarias realmente foi o criador, o
fundador e fez tudo para manter em dia o Seminário Diocesano. Nunca teve
dívida com ninguém durante os quatro anos em que eu lá estive. O espanhol Frei
Casa Nova, que às vezes se hospedava por lá, só para conversar conosco, disse
certa vez: “eu tenho observado que o
cardápio desses seus alunos é muito bom, está realmente seguindo uma
orientação espanhola e veja o seguinte, dizia ele: O Seminário é bom na
comida, bom na disciplina, é esta a impressão que tenho e levo para minha
pátria”.
A respeito da presença dos Padres Salesianos, o Cônego Gualberto oferece
o seguinte testemunho. “Foi sobremodo
importante, porque eles, todas as semanas, infalivelmente, encaminhavam ao
Seminário dois Padres Salesianos, que vinham prontamente para confessar os
meninos. Naquele tempo, a gente se confessava semanalmente; até o próprio
Reitor se confessava, graças a Deus. Na verdade, eles ajudaram muito, na
formação espiritual dos nossos seminaristas. O Seminário teve como Diretores
Espirituais, primeiro monsenhor Abdon Pereira, o segundo foi o Cônego Américo
Sérgio Maia e como terceiro Diretor Espiritual, o Padre Borges, jesuíta”.
O ex-Reitor passa uma mensagem de fé, otimismo, confiança e amor aos
ex-seminaristas. “Para mim, é um momento
de felicidade imensa e gratificante ter a oportunidade de fazer chegar através
desse ex-seminarista, Dr. Francisco Alves Cardoso, aos ouvidos e aos corações
dos meus queridos ex-alunos do Seminário, que sempre eu tenho noticia, de que,
se não chegaram ao sacerdócio ministerial, com certeza abraçaram o sacerdócio
batismal, são homens de bem. D. Moisés Coelho, quando falava aos jovens, dizia
que todos fossem homens de bem, em suas vidas. Eu tenho a alegria de saber que
todos eles dão testemunho do Seminário, levando-o no seu cotidiano
existencial, nas comunidades onde estão realizando as suas atividades
profissionais e felizes com seus adorados familiares.
Graças a Deus, meus queridos ex-alunos, vocês estão
felizes, e muito mais feliz segue aquele humilde e pobre Reitor, que semeou no
coração de vocês alguma semente que nasceu, floresceu e hoje está safrejando.
Assim, estão fazendo realmente tudo de bom para a felicidade do Brasil. Já
dizia Rui Barbosa que a pátria é a família amplificada. Então, meus irmãos,
vocês são uma dessas famílias que contribuem generosamente para a grandeza do
Brasil. Eu continuo a pedir a Deus, Nosso Senhor, todos os dias, três vezes,
pelos meus ex-alunos, para que vocês continuem sempre fazendo o bem a todos e
nunca o mal. Façam o bem aos mais humildes, aos mais pobres e aos mais
necessitados. Que Deus abençoe a todos vocês e cubra de graças e felicidades
os seus familiares”.
REITOR DO
SEMINÁRIO FALA DA FESTA DO CINQÜENTENÁRIO
O Padre Agripino Ferreira de Assis, atual Reitor do Seminário Nossa
Senhora da Assunção, fala de emoções na realização das festividades
programadas para a comemoração dos cinquenta anos de fundação do Seminário.
Ele diz que as expectativas já começaram a surgir desde o ano passado e
continuam até o presente. “Estamos trabalhando,
divulgando e preparando a co-peregrinação com a imagem de Nossa Senhora da
Assunção”.
O Reitor fala da diferença entre o Seminário de 1955 e o Seminário de
hoje: “É claro que existe, na verdade,
uma grande diferença do Seminário de 1955 para o dos dias de hoje. São 50 anos
de caminhada, mudança na Igreja, mudança na visão da formação, mudança na
educação, mudança na família. Tudo isso tem o seu tempo, tem a sua história
belíssima ao longo desse meio século de existência desta Casa de Formação”.
Indagado sobre quantos sacerdotes já foram ordenados pelo Seminário,
responde o Reitor: “Nós fizemos um
levantamento recente e, conforme os dados, já se ordenaram mais de setenta
sacerdotes, graças a Deus”.
"Todos os seminaristas que
por aqui passaram e ainda os que aqui estão atualmente, se de fato aproveitarem
a vida de estudo, a espiritualidade, a vida comunitária, mesmo não sendo
sacerdotes, são profundamente agradecidos e são pessoas que trazem, até hoje,
onde quer que estejam em sua missão, em sua profissão, os agradecimentos, e
levam na bagagem boas recordações e a formação do caráter, da personalidade,
das virtudes que aprenderam no Seminário. Nós também ficamos felizes com essas
pessoas que passaram pelo Seminário e hoje são bem sucedidas na família, no
trabalho e na profissão”.
O Padre Agripino fala também dos reitores que lhe antecederam: “Dom Zacarias Rolim de Moura assumiu a
direção desta Casa durante vinte e sete anos, como Reitor. O primeiro, nós
sabemos, foi o Monsenhor Luiz Gualberto de Andrade, a quem devemos muito como
sacerdote maravilhoso, exemplar pela sua cultura, pela visão de Igreja, pela
visão de mundo. Mons. Luiz Gualberto assumiu durante quatro anos, com muito
amor, à causa da Igreja. Ele foi quem montou a Casa para receber os primeiros
seminaristas. Imagine começar algo do zero, tendo que providenciar tudo. Foi
ele a primeira coluna que até hoje continua dando testemunho desse trabalho de
profundo amor à Igreja. D. Zacarias marcou profundamente, porque primeiro deu
seu zelo de pastor, de Bispo Diocesano e de amor à Igreja. Segundo o Código de
Direito Canônico, o Bispo é o primeiro Reitor do Seminário. Mas Dom Zacarias
transferiu essa responsabilidade ao Mons. Luiz Gualberto e ao Mons. Francisco
de Assis Sitônio, de saudosa memória”.
“Quanto a mim, assumi a reitoria do Seminário em fevereiro de 1992,
antes da minha ordenação presbiterial. Eu era diácono, portanto assumi de fato
e Dom Matias Patrício de Macêdo assumiu de direito, como Bispo da Diocese. Eu
estou aqui até hoje, graças a Deus, muito feliz por colaborar com a Diocese,
com a Igreja do Nordeste, nesse trabalho tão bonito que é a formação
sacerdotal, trabalhando e aprendendo também com esses jovens que vêm de várias
famílias desse Nordeste brasileiro”.
Por fim, o Reitor, Padre Agripino, fez um agradecimento e uma conclamação
pelas vocações sacerdotais: “Nós estamos
profundamente agradecidos por essa abertura e pedimos que todas as pessoas
rezem pelas vocações sacerdotais, para que o cinquentenário do nosso Seminário
possa ser, antes de tudo, um verdadeiro despertar das vocações, um verdadeiro
florescimento no coração daqueles jovens da nossa Diocese, que caminham e às
vezes têm dificuldades de descobrir a sua vocação, para que estão sendo
chamados. Que o Espírito de Deus ilumine cada um daqueles que passaram por aqui,
lhes concedendo muita saúde, muitas alegrias. Muito obrigado e que Deus abençoe
a todos”.
O EXEMPLO DE
PADRE DAGMAR
Infelizmente, estamos vivendo um tempo muito diferente de 1955. Hoje o
ódio predomina. Crimes hediondos, assaltos à mão armada, mortes encomendadas.
Vidas tombadas no Iraque e Afeganistão, culpa única e exclusiva da maldade dos
homens. O amor desapareceu, o ódio entrou no seu lugar.
A nossa legislação penal é muito complacente com a criminalidade. Se os
bandidos não forem duramente castigados, certamente este País vai virar um
“caldeirão do inferno” e os homens de bem perderão o prazer de viver.
Mas ainda existem os exemplos que valem a pena ser enaltecidos. Na
cidade de Sousa, o Padre Dagmar Nobre de Almeida, ex-seminarista fundador do
Assunção, atual Vigário da Paróquia do Bom Jesus Eucarístico Aparecido, criou o
Abrigo do Idoso “Jesus, Maria e José”, com sede no Bairro do Angelim, onde
mantém oito velhinhos internados e dez em regime de externato, com um
acompanhamento cem por cento humano, numa demonstração de que a solidariedade é
o melhor caminho para desbancar o ódio.
O Padre Dagmar enfrenta muitas dificuldades, mas não desiste. Mantém o
abrigo com as suas próprias forças, através de campanhas na comunidade e a fé
religiosa que a cada dia aumenta as suas energias, para continuar a luta em
favor do bem.
Quero, aqui e agora, lançar uma mensagem aos homens de boa vontade deste
imenso Brasil, para que larguem as armas e abracem a paz; abandonem o ódio e
introduzam o amor; condenem a perseguição e adotem a solidariedade.
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O AMIGO DA
HORA DIFÍCIL
Deixei o Seminário, mas continuei ligado aos movimentos religiosos da
Paróquia de Nossa Senhora dos Remédios, em Sousa. Em 1962, fiz amizade com o
Cônego João Cartaxo Rolim, Vigário dos Remédios. Estava em situação muito
difícil, morando na zona rural e trabaIhando na agricultura. O Cônego João
Cartaxo convidou-me para presidir o Sindicato dos Trabalhadores Rurais, que
havia sido fundado em Sousa, com o apoio da sua Paróquia. Aceitei a tarefa e
iniciei os trabalhos, que não foram nada fáceis.
Recebi muita força do vigário para a organização do sindicalismo.
Deixei a zona rural e vim morar na cidade. O Cônego entregou-me uma
casa da Paróquia, onde morei durante vinte anos, gratuitamente. Contratou a
minha mãe, Maria Alves Pereira, para ser zeladora da Igreja.
Com esse apoio, tive condições de recomeçar os estudos na Escola Comercial
de Sousa.
No dia 31 de março de 1964, fui preso em João Pessoa, pelos militares,
sob a acusação de que estava incentivando os movimentos comunistas na região
de Sousa. Naqueles tempos, o sindicalismo rural era tido como uma luta
subversiva.
Recebi apoio integral do amigo Cônego João Cartaxo. A luta ruralista
continuou, mesmo sob ameaças da Revolução.
Estou fazendo justiça a esse grande sacerdote, a quem considero o meu
benfeitor de todos os tempos.
Testemunhei a sua luta em favor das vocações sacerdotais, naquela
Paróquia, inclusive mandando alunos para o Seminário Nossa Senhora da
Assunção, todos os anos.
O seu apoio, naquele momento tão difícil, foi de fundamental importância
para a minha vida. Sem a sua ajuda, talvez ainda estivesse trabalhando na zona
rural. A minha vitória, devo em grande parte, ao Cônego João Cartaxo, um homem
sério, honesto cumpridor dos seus deveres, sacerdote íntegro, corajoso e leal.
O FINAL DAS
NOITES
Diariamente, às dezenove horas, era iniciado o período de estudo
noturno, no salão que ficava na Capela da Assunção. O estudo se prolongava até
às vinte e uma horas, quando o padre Reitor chegava para as orações da noite.
No final das orações, todas as três divisões seguiam em fila rumo aos dois
dormitórios. O dormitório número um era exclusivo para os maiores, enquanto que
o dormitório número dois era dividido para os médios e menores.
Antes de subirem os degraus dos dormitórios, todos cantavam juntos o
hino de despedida do dia: “LENTA E CALMA
SOBRE ATERRA, DESCE A NOITE E FOGE A LUZ; QUERO AGORA DESPEDIR-ME, BOA N.OITE,
MEU JESUS”